o telegrama

O Juvenal estava desempregado há meses.

Com a resistência que só os portugueses têm, o Juvenal foi tentar mais um emprego em mais uma das muitas entrevistas.

Ao chegar ao escritório, o entrevistador observou que o candidato tinha exactamente o perfil desejado, as virtudes ideais e perguntou-lhe:

- Qual foi o seu último salário?

- Salário mínimo, respondeu o Juvenal.

- Pois se o Senhor for contratado, ganhará 10 mil euros por mês!

- A sério?

- Que carro o Senhor tem?

- Na verdade, agora só tenho um carrinho pra vender pipocas na rua e um carrinho de mão!

- Pois se o senhor trabalhar connosco ganhará um Audi para si e um BMW para a sua esposa! Tudo zero Km!

- A sério?

- O senhor costuma viajar?

- O mais longe que fui foi até Badajoz, comprar caramelos...

- Pois se o senhor trabalhar aqui viajará pelo menos 10 vezes por ano, para Londres, Paris, Roma, Mónaco, Nova Iorque, etc.

- A sério?

- E digo-lhe mais... o emprego é quase seu. Só não lhe confirmo agora porque tenho que falar com meu gerente. Mas é praticamente garantido. Se até amanhã (6ª feira) à meia-noite o senhor NÃO receber um telegrama nosso a cancelar, pode vir trabalhar na segunda-feira com todas estas regalias que eu citei. Então já sabe: se NÃO receber o telegrama a cancelar até à meia-noite de amanhã, o emprego é seu!

O Juvenal saiu do escritório radiante.

Agora era só esperar até à meia-noite da 6ª feira e rezar para que não aparecesse nenhum maldito telegrama.

Sexta-feira mais feliz não poderia haver.

E o Juvenal reuniu a família e contou as boas novas.

Convocou o bairro todo para uma churrascada comemorativa à base de muita música.

Sexta à tarde já tinha comprado um barril de cerveja enorme.

Às 9 horas da noite a festa fervia.

A banda tocava, o povo dançava, a bebida rolava por todos.

Dez horas, e a mulher do Juvenal aflita, achava tudo um exagero...

A vizinha boazona, interesseira, já se atirava à descarada ao Juvenal.

E a banda tocava!

E a cerveja gelada passava!

O povo dançava!

Onze horas, o Juvenal já era o rei do bairro.

A gastar horrores para o bairro encher a pança.

Tudo por conta do primeiro salário.

E a mulher resignada, meio aflita, meio alegre, meio aparvalhada, meio assustada.

Às onze horas e cinquenta e cinco minutos... Vira na esquina a buzinar feito um louco, um tipo numa vespa...

Era do Correio!

A festa parou!

A banda calou-se!

A mulher engasgou-se!

Um bêbado arrotou!

Uma velha peidou-se!

Um cão uivou!

Meu Deus, e agora? Quem pagaria a conta da festa?

- Coitado do Juvenal!

Era a frase mais ouvida.

- Joguem água na churrasqueira!

A mulher do Juvenal desmaiou!

A motociclista parou!

O tipo desceu da vespa e dirigiu-se ao Juvenal:

- Senhor Juvenal Batista Romanos Carvalho?

- Si, si, sim, so, so, sou eu...

A multidão não resistiu...

OOOOOHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!

E o tipo da vespa:

- Telegrama para o senhor...

O Juvenal não acreditava...

Agarrou o telegrama, com os olhos cheios de água, ergueu a cabeça e olhou para todos.

Silêncio total.

Não se ouvia sequer uma mosca!

O Juvenal respirou fundo e abriu o envelope do telegrama a tremer, enquanto uma lágrima caia.

Olhou de novo para o povo e a consternação era total.

Tirou o telegrama do envelope, abriu e começou a ler.

O povo em silêncio aguardava a notícia e perguntava-se:

- E agora? Quem vai pagar esta festa toda?

O Juvenal recomeçou a ler, levantou os olhos e olhou mais uma vez para o povo que o encarava...

Então, o Juvenal abriu um largo sorriso de alívio, virou-se para o povo e gritou:

– Foi a minha mãe que morreuuuuuuuu! Podem continuar a festa...
 
Back
Top